Segurança Pública: nada está tão mal que não possa piorar

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O confronto entre a PM do Rio e os traficantes do Complexo de Israel durante a última semana revelou ao Brasil e ao mundo a caótica situação da segurança pública carioca. Mostrou o poder bélico do crime organizado, que desafia e intimida a polícia estatal com a petulância própria de quem tem poder de fogo para isso.

Culpar o atual governador por essa guerra urbana insana que se vive no RJ é ser muito cínico ao ponto de querer esconder os verdadeiros culpados.

Um oficial da PM de Copacabana, em dez dias prendeu três vezes o mesmo meliante. Isso significa que a PM está enxugando gelo, pois ela prende e a Justiça solta.

É verdade! A política pública criminal do nosso país recomenda que responda solto, em liberdade, aquele criminoso, mesmo aquele preso em flagrante delito – quando o crime por ele cometido não apresente pena superior a quatro anos – e se não houver violência ou grave ameaça à pessoa.

O crime de furto, por exemplo, se enquadra nessa situação. Se a autoridade policial insistir em prender, pode acabar respondendo por abuso de autoridade, que é um crime cuja pena é maior ainda.

O Brasil é um convite para o crime e você vem culpar o governador do Rio?

A política de desencarceramento de presos está de vento em popa, com o CNJ e o STF em mutirão para soltura de apenados – o que só aumenta o contingente do exército do crime, porque são eles os soldados que recebem um fuzil e trocam tiro com a polícia.

Mas a culpa é do governador...

Temos uma polícia que trabalha sob pressão, sem a menor segurança jurídica, sendo perseguida por uma imprensa “policiofóbica” e cúmplice desse macabro sistema - uma polícia que só pode reagir depois de levar um tiro primeiro, se sobreviver – uma polícia que pugna pelos direitos humanos, mas está submetida aos direitos dos manos – e você realmente acha que a culpa é do governador?

Por fim, nessa esteira de culpados pela trágica situação da nossa segurança pública vale destacar a decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), que proibiu, em liminar, a realização de operações policiais em comunidades do Rio.

A decisão que já nasceu polêmica e controversa, foi tomada para a época da pandemia, mas se perpetuou no tempo – um absurdo ainda maior!

A partir de 5 de junho de 2020 as facções criminosas aram oficialmente a dominar seus territórios. Construíram barricadas de concreto e o poder público já não podia entrar. 

Há quatro anos que o Rio de Janeiro virou “o paraíso” onde se hospedam grandes criminosos líderes de facções de todo o Brasil e foragidos da Justiça. Com a proteção dada pelo Fachin, as comunidades cariocas viraram verdadeiros hotéis 5 estrelas.

Não seja hipócrita de culpar o governador. Hoje, o tráfico de drogas já não é a atividade criminosa mais rentável para essas quadrilhas, que vendem gás, TV a cabo e internet em seus territórios, graças a decisão do Fachin e endossada pelo STF.

Mas...

Realmente a operação policial que parou a cidade do Rio de Janeiro nessa semana apresenta uma diferença – uma peculiaridade: o carioca está acostumado a ver a polícia enfrentando o Comando Vermelho ou as milícias. Dessa vez a guerra era contra o T (Terceiro Comando Puro) – uma outra facção criminosa – liderada pelo Peixão (Álvaro Malaquias Santa Rosa), que se diz evangélico.

Aqui vale uma observação: entrou a “fundamentação religiosa” no cenário. Surgiu a fé como um novo ingrediente nessa receita -.o “Narcopentecostalismo”. Aquele soldado do crime fica mais perigoso ainda, porque agora ele usa o seu fuzil em nome de Deus. Ele se sente legitimado e tem potencial para cometer as maiores atrocidades sem peso na consciência – tudo em nome de Deus.  

Só faltava essa!

Rapidamente lembramos dos soldados do Hamas que invadiram Israel há um ano e cometeram aquelas barbaridades em nome de Deus. Se entregar um fuzil nas mãos de um terrorista dá nisso, entregar nas mãos de um traficante também. 

Por aqui os traficantes do T se autodenominam “Tropa de Arão” — uma figura bíblica, irmão de Moisés. O território foi batizado de “Complexo de Israel” pelo chefe da Tropa (Peixão) — uma referência à “terra prometida” para o “povo de Deus” na Bíblia.

Enfim, não há muito o que fazer diante desse panorama a não ser rezar. 

Foto de Carlos Fernando Maggiolo

Carlos Fernando Maggiolo

Advogado criminalista e professor de Direito Penal. Crítico político e de segurança pública. Presidente da Associação dos Motociclistas do Estado do Rio de Janeiro – AMO-RJ. 

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